Montadoras travam disputa por incentivos a carros elétricos no Brasil
BYD e representantes da Anfavea pressionam o governo sobre tarifas de importação e nacionalização da produção
Por: Lorena Bomfim
05/08/2025 • 19:00
Uma disputa entre montadoras pelo mercado brasileiro de carros elétricos e híbridos mobilizou o setor automotivo e chegou ao Palácio do Planalto. De um lado, está a chinesa BYD, que vem expandindo sua presença no país. Do outro, estão as tradicionais Toyota, General Motors, Volkswagen e Stellantis, representadas pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
As montadoras enviaram, em junho, uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alertando sobre possíveis riscos a investimentos e empregos caso o governo atenda ao pedido da BYD para reduzir temporariamente a tarifa de importação de veículos elétricos ou híbridos desmontados (CKD). A carta foi divulgada nesta semana nas redes sociais pelo presidente da Volkswagen no Brasil, Ciro Possobom.
“A importação de conjuntos de peças não será uma etapa de transição para um novo modelo de industrialização, mas sim um padrão operacional que tende a se consolidar, reduzindo o alcance da produção nacional”, afirma o documento.
As montadoras alegam que a indústria planeja investir R$ 180 bilhões nos próximos anos e que tais planos podem ser comprometidos caso a medida seja aprovada.
BYD reage e acusa concorrentes de “chantagem emocional”
Em resposta, a BYD classificou a posição da Anfavea como uma tentativa de frear a inovação e a abertura do mercado. Em nota enviada à Agência Brasil, a montadora chinesa afirmou que a reação das concorrentes seria motivada pela perda de protagonismo.
“É uma espécie de chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria. A ironia é que, enquanto as cartas se empilham em Brasília, os consumidores já tomaram sua decisão”, afirmou a empresa.
“Agora chega uma empresa chinesa que acelera fábrica, baixa preço e coloca carro elétrico na garagem da classe média — e os dinossauros surtam”, provocou.
A BYD argumenta que o pedido de redução temporária da tarifa de importação de veículos desmontados é razoável, pois não seria justo aplicar a mesma tributação de carros completamente montados. A empresa também destaca que outras montadoras já adotaram a prática antes de completar a produção local.
Discussão na Camex
O impasse está sendo analisado pelo Comitê-Executivo de Gestão (Gecex) da Câmara de Comércio Exterior (Camex), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC). A reunião extraordinária sobre o tema ocorre nesta quarta-feira (30).
A Anfavea defende a antecipação, de 2028 para 2026, da elevação das tarifas de importação de veículos desmontados — o que prejudicaria diretamente a BYD. Já a fabricante chinesa pede a redução temporária do imposto, argumentando que precisa de tempo para nacionalizar a produção.
A BYD afirma ainda que sua solicitação é temporária e está relacionada ao período de conclusão da sua fábrica em Camaçari (BA), que deve iniciar a produção em breve. “Em menos de um ano e meio, já estamos finalizando a primeira etapa das obras. Tudo dentro do cronograma desde o início”, afirmou a empresa.
Governo busca solução intermediária
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, destacou que o governo já havia iniciado uma transição tributária para veículos elétricos. Em 2023, a alíquota para esses veículos era de 0%, enquanto os carros à combustão já pagavam 35%. A meta do governo é equiparar a tributação até 2026.
“Faça sua fábrica no Brasil, fabrique no Brasil, porque a alíquota vai ser igual à dos carros à combustão, como sempre foi”, declarou Alckmin, em coletiva de imprensa.
Segundo o ministro, a estratégia vem atraindo investimentos, como o da GWM, que adquiriu a antiga planta da Mercedes-Benz em Iracemápolis (SP), e o da própria BYD, que ocupa a antiga fábrica da Ford na Bahia.
Uma das soluções em análise na Camex é a ampliação da cota de importação isenta de impostos. Atualmente, essa cota é de 50 mil unidades no primeiro ano, reduzindo para 40 mil no segundo e 30 mil no terceiro ano. A ideia seria manter essa isenção até 1º de julho de 2026, como forma de equilibrar os interesses da BYD e da Anfavea.
“Essa proposta seria uma saída intermediária: antecipar a alíquota cheia para 2026, como quer a Anfavea, e manter uma cota até lá, como pede a BYD. A decisão será tomada pelo Gecex e, depois, pela Camex, que reúne dez ministérios”, finalizou o ministro.