Crise do IOF expõe tensão entre governo e Congresso
Planalto adota cautela e espera Lula para retomar articulação política
Por: Iago Bacelar
04/07/2025 • 08:22
Após o Congresso Nacional derrubar o reajuste do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) proposto pelo Executivo, o governo federal adotou uma postura de cautela. A orientação do Palácio do Planalto passou a ser “jogar parado” como forma de distensionar o clima com o Legislativo e evitar nova crise institucional.
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumpre compromissos no exterior e lideranças do PT se envolvem nas eleições internas do partido, a articulação política ficou a cargo do segundo escalão do governo. A estratégia é retomar o diálogo e conter os danos após a derrota histórica no Congresso.
Encontro entre Fazenda e Senado marca início da trégua
Nesta quarta-feira (2), o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, se reuniu com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Segundo fontes ouvidas, o encontro foi considerado produtivo e indicou disposição mútua para negociação.
Do lado do Executivo, houve apelo para ajudar o governo a cumprir a meta fiscal de 2025 sem comprometer os planos eleitorais da base. Já o Legislativo solicitou que o discurso de confronto entre ricos e pobres, impulsionado por lideranças petistas, fosse desmobilizado.
Ministros tentam conter tensão com Câmara
Nas redes sociais, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, pediu o fim dos ataques ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). O deputado foi responsabilizado por pautar e aprovar, sem aviso prévio, a proposta que derrubou o decreto do IOF. A ofensiva digital contra ele incluiu a expressão “Congresso da mamata” entre os assuntos mais comentados do X (antigo Twitter).
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), também defendeu o encerramento da ofensiva. “Pelo menos no campo da narrativa pública, é preciso frear esse embate direto com o Congresso”, disse, em referência à necessidade de proteger futuras votações.
Entenda a crise entre Planalto e Congresso
A crise começou com o anúncio do aumento do IOF, feito no final de maio, com o objetivo de elevar a arrecadação em quase R$ 20 bilhões. O recurso seria usado para cumprir a meta fiscal de 2025. Após reações negativas do Congresso, o governo recuou e reduziu o reajuste, acordando com os presidentes da Câmara e do Senado o envio de uma Medida Provisória (MP) para compensar a diferença.
Apesar do acerto, o presidente da Câmara pautou e aprovou, no dia 16 de junho, o requerimento de urgência que visava derrubar o reajuste do imposto. O governo ainda teria 15 dias para apresentar uma solução política. No entanto, no dia 25, Hugo Motta surpreendeu até líderes governistas ao pautar e aprovar a proposta, que revogou totalmente o aumento do IOF.
A votação foi simbólica. O governo teve apenas 98 votos favoráveis e registrou a primeira derrubada de um decreto presidencial desde Fernando Collor. Com isso, o Executivo afirma que, sem os recursos do IOF e da MP, pode ser obrigado a cortar programas sociais e bloquear emendas parlamentares.
Lula deve entrar no circuito na próxima semana
Lula estava na Argentina, reassumindo a presidência do Mercosul, e deve participar da cúpula do Brics no Rio de Janeiro. Segundo aliados, o presidente deve se envolver diretamente nas negociações sobre o IOF apenas a partir do meio da próxima semana, já que o domingo (6) está reservado para a eleição interna do PT.
Durante esse período, integrantes da cúpula do Congresso também estão fora do país. Parte dos parlamentares participa do Fórum Jurídico de Lisboa, apelidado informalmente de “Gilmarpalooza”, promovido pelo ministro do STF Gilmar Mendes.
Entre os presentes no evento está o advogado-geral da União, Jorge Messias, autor da ação protocolada no STF para tentar reverter a decisão do Congresso. A judicialização da pauta marca o nível de tensão entre os Poderes, mas a ordem interna no governo é de recuo tático, enquanto se aguarda a evolução das negociações políticas.
Executivo joga com as cartas à mesa
Com os ataques contidos e o STF acionado, o governo tenta emparedar o Congresso. A possibilidade de não sancionar o projeto que amplia o número de deputados federais também foi ventilada como forma de pressionar parlamentares. A aposta agora é manter o desgaste no campo simbólico e evitar novos confrontos diretos até que Lula retorne ao Brasil e reassuma o comando das tratativas.